De Goiás para o mundo

A cachaça, depois de ser considerada produto genuinamente brasileiro, ganhou status e consumidores pelo mundo todo. Apesar de ter uma média anual de produção de cerca 2,5 milhões de litros produzidos em cerca de mil alambiques presentes em todas suas regiões, Goiás exporta somente uma marca e tem a cerificação do Ministério da Agricultura de apenas 18. De acordo com a Secretaria de Indústria e Comércio (SIC), se considerado todo o Estado, é possível contabilizar um estoque de aproximadamente dois milhões de litros, envelhecidos em barris de carvalho, bálsamo, jequitibá e outras madeiras nobres. 

Foto: Divulgação

                                                                                                                                                                                                                                                                   Foto: Divulgação

Para mudar esse quadro e aproveitar o crescimento desse filão no mercado interno e externo, produtores goianos se preparam para produzir cachaça de qualidade padronizada e certificada com o selo “Cachaça de Goiás”. Para isso, o governo de Goiás já reduziu a taxa tributária de 25% para 10% e adota medidas para especializar e fomentar o crescimento do setor. Estas e outras informações são fornecidas pelo assessor especial do Programa Pró-Cachaça de Goiás da Secretaria de Indústria e Comércio, Moacir Ferreira da Silva.

Moacir revela que o primeiro passo foi dado a pedido dos próprios produtores e “em junho do ano passado foi formalizado o Arranjo Produtivo Local (APL), da cachaça de Goiás”. Ele explica que o APL tem como foco valorizar vocações regionais e organizar a rede produtiva. “O objetivo é fomentar e desenvolver a cadeia produtiva da bebida por meio da capacitação de produtores e do oferecimento de linhas de crédito para fomentar o crescimento do setor”, explica o assessor. 

NO PÁREO

O assessor da SIC também conta que o Pró-Cachaça segue modelo de programa de Minas Gerais, Estado considerado o maior produtor de cachaça artesanal do mundo. Minas é responsável por exportar diversas marcas para diferentes países, além de dominar o mercado nacional. “Dessa forma, Goiás tornou-se o segundo Estado do Brasil a ter um programa de fomento da cachaça artesanal”, comemora.

Moacir também explica que a iniciativa já tem sido reconhecida e destilarias goianas participaram como convidadas de grandes eventos como a Expocachaça, em Belo Horizonte, e a Feira Mundial da Cachaça, em Salinas, localizada no nordeste mineiro. “Também fomos convidados para participar, junto com Minas, da Feira Internacional de Alimentos, realizada em Miami, nos Estados Unidos, mas os produtores não estavam preparados e por isso não participamos”, segreda o assessor do Pró-Cachaça. Ele revela também que no ano passado Goiás participou do 6º Congresso Brasileiro de APLs, promovido pelo Ministério da Indústria e Comércio (MDIC). “Na ocasião, Goiás se destacou como o único Estado presente a constituir e formalizar o APL da Cachaça”, comemora.

APRIMORAMENTO

“Para transformar a cachaça goiana em bebida tipo exportação é preciso formalizar 98% dos produtores”, declara Moacir ao mencionar que Goiás repete a situação do Brasil que tem a maioria de seus alambiques na informalidade. Ele conta que o Estado foi divido em quatro regiões produtoras e que num balanço preliminar foi verificado cerca de 800 a mil alambiques em Goiás.

A região de Posse engloba destilarias dos municípios da Região nordeste e norte; já a de Alexânia engloba o Entorno de Brasília e região central de Goiás incluindo Goiânia; a da Estrada de Ferro tem Caldas Novas, Morrinhos, Orizona e outros e; a região de Iporá engloba os municípios do sul e sudoeste goiano.

Moacir conta que em Posse existem cerca de 100 alambiques, mas o destaque é o povoado da Branquinha com 40 estabelecimentos desse porte e, por isso, é um lugar que merece atenção na capacitação e modernização dos alambiques. “O modo de produção lá ainda é bastante tosco e carece de muitos investimentos e formação profissional para produzir uma cachaça de qualidade”, esclarece. O assessor da SIC explica que a intenção é levar especialização a produtores de todas as regiões, promovendo parceria com Minas, onde existe uma universidade da cachaça. Ele revela que, na busca da padronização, está prevista a criação de um instituto de certificação em parceria com UFG, UEG, Sebrae e outros institutos de pesquisa. Para esse propósito, existe um projeto piloto com laboratório para análise, alambique completo e canavial, que poderá ser também utilizado no futuro para cursos de pós-graduação em cachaça.

Cachaças goianas já se destacam

Algumas marcas goianas se destacam nesse mercado emergente da “cachaça de luxo”, dentre elas a Doministro e a Cambéba, ambas de Alexânia. A primeira é produzida na fazenda do ex-ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Carlos Átila. Apreciador da boa cachaça de engenho ele iniciou sua produção em 1990 e em 2001, após laudos de análise laboratoriais emitidos pelo Ministério da Agricultura, passou a produzir e a vender o produto em larga escala. 

Atualmente, uma garrafa da cachaça Doministro, envelhecida em tonel de carvalho por cinco anos, é comercializada a R$ 52, por garrafa de 700ml. Por outro lado, uma caixa com 12 miniaturas de 50 ml da cachaça Ouro – envelhecida por mais de um ano –, custa R$ 72. A Prata – envelhecida em dornas de jequitibá rosa – chega a custar R$ 60 por dúzia de garrafinhas com 50ml.

Já a Cambéba – que em tupi-guarani quer dizer cabeça chata – migrou de um povoado do Ceará com o mesmo nome para Goiás e aqui conquistou certificação de produto orgânico no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa. Por isso, tornou-se a única exportadora goiana de cachaça e vende para 20 países. Além da ouro e prata ela produz também a Mata Preguiça. Estes produtos são vendidos a valores superiores a R$ 30 uma garrafa de 700 ml. 

 Em Planaltina de Goiás, também no Entorno de Brasília, é produzido o rum Barão do Cerrado. Bebida típica do Caribe, o rum goiano se impôs como produto de qualidade e recentemente foi escolhido como a segunda melhor marca do mundo. 

 Diferenças entre a cachaça industrial e a artesanal

 O que diferencia a cachaça artesanal da aguardente industrializada é o modo de produção e armazenamento. A produção industrial é feita em larga escala, a garapa da cana-de-açúcar é colocada para fermentar em tanques de aço inox, e possui um teor alcoólico mais elevado. Quando fabricada, os produtos tóxicos se desprendem do aço e do processo de fermentação natural não são retirados.

Já a cachaça de engenho passa por um processo diferente. A garapa é fermentada em alambique de cobre que lhe confere um sabor especial, A destilação é feita em três partes, a primeira – de alto teor etílico e recheada de elementos químicos nocivos à saúde – é descartada. A última, conhecida como calda rala, possui menos álcool, mas também elementos nocivos. 

A cachaça própria para consumo fica no meio e é chamada pelos especialistas como coração. Essa parte é envelhecida em barris de carvalho, jequitibá rosa, bálsamo e outras madeiras, por no mínimo 18 meses, mas se guardada por mais tempo fica ainda melhor. A graduação varia entre 38° a 44°, mas o ideal para o consumo é de 40°.

COMÉRCIO

A fabricação de alambiques está a todo vapor. Nos últimos anos, as empresas especializadas na produção desses equipamentos de cobre, indispensáveis à elaboração da cachaça artesanal, têm registrado índices de crescimento anual de negócios que variam de 20% a 30%. A alta nas vendas é motivada, principalmente pela expansão do interesse na cana-de-açúcar para produção de álcool e pela melhoria da economia. 

Publicado no Diário da Manhã.