A cachaça busca sua identidade

A brasileiríssima cachaça, cuja história se confunde com a história do Brasil, está sendo foco de uma polêmica discussão. Estão sendo analisados no Congresso dois projetos de lei que visam a regulamentar a produção do destilado. Há, no entanto, uma polêmica sobre a semântica relacionada à denominação do produto. O pomo da discórdia está na postura de um grupo que deseja que o nome cachaça seja aplicado apenas às produzidas em alambiques e às de coluna, o nome de aguardente.

Cachaça, aguardente, pinga, são inúmeras as denominações. O importante hoje é acabar com a discriminação ainda existente e difundi-la cada vez mais no exterior. Para isso são necessários a definição e o cumprimento de identidade e qualidade para atender ao exigente mercado externo.

É necessário que haja unidade na denominação do produto não só para não confundir o consumidor interno, mas também para o posicionamento da bebida no exterior. Nesse sentido, o Projeto de Lei n.º 1.187/2007, do deputado Valdir Colatto, vai ao encontro das expectativas do setor. O texto evita o engessamento por um projeto de lei que dificulte e inviabilize quaisquer alterações ou revisões no ordenamento legal que sejam necessárias para corrigir questões, assim como para viabilizar iniciativas evolutivas referentes às especificações técnicas ou de qualidade da cachaça.

A cachaça é o terceiro destilado mais consumido no mundo, atrás apenas da vodca e do soju, destilado coreano feito do arroz e da batata-doce, consumido em toda a Ásia. Sua origem está envolta em fatos históricos, sociológicos e econômicos que caracterizam o nosso país desde o seu descobrimento. Atualmente, segundo o Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), a indústria no Brasil tem capacidade instalada de produção de aproximadamente 1,2 bilhão de litros; são mais de 40 mil produtores; 4 mil marcas; e é responsável por 600 mil empregos diretos e indiretos.

Infelizmente, 90% da produção dita artesanal ainda está nas mãos de produtores não legalizados.

No Brasil apenas a cerveja, um fermentado, é mais consumida do que a cachaça. O brasileiro bebe cerca de 11 litros/ano de cachaça, superando tradicionais consumidores de destilados, como os alemães, os húngaros e os poloneses (entre 9 e 10 litros/ano).

É importante ressaltar que, apesar da capacidade instalada, menos de 1% do que é produzido anualmente é exportado. São aproximadamente 180 empresas que exportam para mais de 55 mercados. Os últimos números do setor mostram que, em 2008, foram exportados 11,9 milhões de litros, que geraram uma receita de US$ 16,41 milhões, o que representou um crescimento de 18% em valor e de 20% em volume em relação a 2007. Nos mercados de destino da cachaça figuram países como Alemanha, Estados Unidos, França, entre outros.

A cachaça, apesar de qualificada por meio do Decreto n.º 4.062, de 21 de dezembro de 2001, como um produto de origem genuinamente brasileira e aprovado pelos consumidores de todos os continentes, ainda não é reconhecida internacionalmente. Nos Estados Unidos entra no mercado ainda como "Brazilian Run", embora existam diferenças marcantes no sabor e na produção das duas bebidas.

Está em negociação o reconhecimento do termo e da denominação de origem. Na Europa e nos demais mercados o trabalho é pelo reconhecimento da indicação geográfica da bebida, o que vai garantir a exclusividade de sua fabricação no Brasil, já que hoje no mercado internacional há várias marcas de cachaça que não são brasileiras e que competem diretamente com o nosso produto.

A indicação geográfica certificaria a origem, o que resultaria no incremento de nossas exportações. Esse, sim, é um posicionamento em que toda a cadeia produtora deve estar unida, evitando-se possíveis divisões que possam inviabilizar o crescimento e o fortalecimento da cachaça como produto único e exclusivo do Brasil.

CONSELHEIRO HONORÁRIO DO IBRAC,

É AUTOR DO LIVRO "CACHAÇA - O MAIS BRASILEIRO DOS PRAZERES"