Cervejarias e cachaçarias lucram com aumento do consumo de bebidas na Copa do Mundo

Jogos têm estimulado a produção a partir de cana-de-açúcar e cereais cultivados no Estado

 

Caipirinha com vodka ou cachaça? Se a pergunta for feita a um brasileiro, a resposta provável será vodka. Um estrangeiro tende a optar pela segunda opção. Associada ao Brasil no Exterior, a caipirinha com cachaça foi desejo recorrente entre turistas que desembarcaram no país para acompanhar a Copa do Mundo. A tabelinha com o futebol é liderada por outra bebida produzida com matéria-prima agrícola e popular entre consumidores de todas as nacionalidades.

Para aplacar a sede dos torcedores, a indústria cervejeira brasileira produziu 3,2 bilhões de litros da bebida no segundo trimestre do ano. O volume é 12% maior do que o registrado no mesmo período de 2013, segundo a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil), que reúne as quatro maiores fabricantes, responsáveis por 96% do mercado no país.


Com a terceira maior produção de cerveja do mundo, atrás da China e dos Estados Unidos, o Brasil produz 13,5 bilhões de litros anuais da bebida, que tem como base a cevada. Líder entre as 50 fabricantes brasileiras, a Ambev passou a operar recentemente com capacidade máxima a maltaria instalada em Passo Fundo, uma das principais regiões produtoras do cereal no país.

— Temos dois importantes pólos produtivos no país, um no planalto médio gaúcho e outro na região paranaense de Guarapuava — ressalta Dércio Oppelt, gerente agrônomo da Ambev.

Na unidade de Passo Fundo, são produzidas por ano 112 mil toneladas de malte, extraído da cevada para produção da cerveja. A outra maltaria da marca no Estado fica em Porto Alegre e produz 90 mil toneladas do extrato.

— Dobramos a capacidade de produção de malte no Rio Grande do Sul, onde é cultivada mais de 50% da cevada usada como matéria-prima para nossas fábricas — acrescenta Oppelt.

Caipirinha reforçada nos bares e nas festas

Maior produtora de cachaça artesanal de alambique no Rio Grande do Sul, a Weber Haus também aumentou a produção para acompanhar a evolução das vendas no período da Copa. Em junho, as encomendas foram 30% maiores na comparação com igual período de 2013.

— Enquanto brasileiros rejeitam a caipirinha com cachaça, estrangeiros enxergam a bebida como um diferencial — diz Evandro Luis Weber, diretor da Cachaçaria Weber Haus, de Ivoti.

A procura maior foi percebido em bares e restaurantes que vendem o produto gaúcho.

— Encomendas que eram feitas a cada 60 dias foram repetidas em 15 dias — conta Evandro.

A curiosidade dos estrangeiros pela cachaça brasileira é resultado da divulgação feita por exportadoras e agências de promoção. Uma das estratégias para explorar o potencial da bebida é incluí-la em receitas de drinks vendidos em bares e casas noturnas do Exterior. 

A cachaçaria gaúcha foi uma das 13 empresas brasileiras inseridas no projeto Seleção Brasileira de Alimentos. Além das premiações internacionais, a escolha levou em conta a certificação orgânica da produção. São 22 hectares cultivados com cana sem produtos químicos.

— Temos o ciclo fechado: plantamos, fazemos o manejo e fabricamos a bebida. Os produtos orgânicos são muito valorizados no Exterior — justifica Evandro, que irá iniciar a colheita da cana ainda neste mês.

Reconhecimento em premiações

Reconhecida pela qualidade, a produção gaúcha de cachaça ainda é pequena se comparada com a de Estados como Minas Gerais e São Paulo. O volume fabricado no Rio Grande do Sul gira em torno de 15 milhões de litros anuais — pouco mais de 1% do total brasileiro — conforme a Associação dos Produtores de Cana-de-Açúcar e Seus Derivados (Aprodecana-RS).

— Nos prêmios nacionais sempre há um alambique gaúcho. Os produtores se qualificaram, adotaram leveduras selecionadas, embalagens atraentes e padronizaram produtos. Por isso são respeitados no mercado — afirma Fernando Andrade, coordenador da Câmara Setorial das Bebidas Regionais da Secretaria Estadual da Agricultura.

Com 26 alambiques registrados no Ministério da Agricultura, o Rio Grande do Sul tem boa parte da produção ainda informal. Conforme a Aprodecana-RS, ao menos 2,5 mil alambiques produzem a bebida no Estado.

— A informalidade é muito grande, especialmente pela carga tributária, que representa 75% do custo da cachaça — diz Andrade.

Grande parte dos fabricantes de cachaça tem produção própria de cana-de-açúcar. Os canaviais se concentram no Litoral Norte, na região Central e no Noroeste.

Alencar Rugeri, assistente técnico estadual da Emater, avalia que a cultura da cana-de-açúcar no Rio Grande do Sul tem potencial para crescer, mas precisa de produção mais especializada, com mecanização nas lavouras e maior formalização do setor.

— É uma atividade que requer muita mão de obra. A produtividade ainda é baixa pela pouca profissionalização da atividade — completa Rugeri.

Maltaria abre mais espaço à cevada

Atrelada à indústria cervejeira, a produção de cevada na Região Sul é insuficiente para atender à demanda dos fabricantes: ao menos 30% dos grãos vêm da Argentina. Da safra brasileira, mais de 40% tem origem no Estado.

— A cevada é uma cultura de inverno mais sensível do que o trigo, especialmente na pré-colheita — explica Cláudio Doro, técnico regional de produção vegetal da Emater de Passo Fundo.

Boa parte do sucesso de uma lavoura de cevada depende da germinação mínima de 95% dos grãos para o cereal ser transformada em malte.

— Com a chuva forte, no ano retrasado, perdemos praticamente toda a safra na véspera da colheita — recorda Geferson Saggiorato, produtor de Mato Castelhano.

Saggiorato é um dos agricultores da região que destina 100% da safra do grão para a maltaria da Ambev em Passo Fundo. Na tentativa de aumentar a área cultivada de cevada no país, a companhia está adotando nova forma de remuneração ao produtor neste ano. Além de sementes e fertilizantes a preços subsidiados, estabeleceu preço mínimo e máximo para o grão, com base na cotação do trigo na Bolsa de Chicago no dia da venda. Antes, o preço era fixo e estabelecido previamente.

Publicado no Zero Hora.